Estes são
dias de competição, superação, decepções e premiações, na Olimpíada esportiva,
mas também no enfrentamento entre justiça e impunidade no triste processo
chamado mensalão que nos aflige. Ainda longe do final, quero, aqui do meu ponto
de vista, conceder uma medalha de ouro ao procurador-geral da República,
Roberto Gurgel, com o respeito, a admiração e o reconhecimento de uma
brasileira preocupada. Medalha pela serenidade, compostura, precisão,
tecnicidade jurídica, evidências tantas vezes comprovadas, citadas em dia e
página. Pela coragem, que não há de ser pouca. Pela possibilidade de que
prevaleça a justiça, punindo-se culpados e absolvendo-se inocentes.
Sou filha de professor de direito e
diretor de faculdade de direito até sua prematura morte. A Senhora Justiça era
personagem em nosso cotidiano: lá estava na escrivaninha dele uma estatueta de
prata da referida dama vendada, em uma das mãos a balança, na outra a espada.
Andam meio esquecidas por aqui, ela e suas parceiras Decência, Integridade,
Bravura. O resultado da luta aqui travada agora, porém, pode curar feridas, e
abrir caminhos para a renovação neste país.
Agora, à Olimpíada esportiva: admirável
a organização britânica. Solenidade e bom humor discreto e elegante. Belíssima
a abertura, e motivo de orgulho nosso a ex-ministra Marina Silva ser uma das
personalidades mundiais ligadas à paz e à preservação da natureza a segurar a
bandeira desse evento. (Infelizes comentários de nossas autoridades nem merecem
ser aqui citados: não gasto bom papel com tema ruim.) Esperemos que na
Olimpíada esportiva do Brasil, em quatro anos, a organização seja parecida,
dispensados os comentários e atitudes desastrosas que nos tornariam pequenos
aos olhos do mundo.
Nosso país não está se saindo muito
bem até agora: é de espantar que nossos atletas consigam medalhas de bronze e
alguma de ouro. Enquanto escrevo, uma segunda dourada aparece, um atleta não
muito badalado, que superou as nossas falhas com suas virtudes: transbordando
decência, disciplina, humildade e uma enorme bravura. Agradecendo, pediu ao
Brasil mais oportunidades e estímulo, mais cuidado com os jovens atletas,
coisas que não recebem nos duros anos de sua preparação: muitos e excelentes
centros de treinamento, preparadores bem pagos, ótimo atendimento médico, os
melhores psicólogos que os ajudem a enfrentar, além do sobre-humano esforço
físico, o forte desgaste emocional. Quase não vi atletas estrangeiros
deprimidos ao obter um bronze, conscientes de estarem entre os três melhores do
mundo em sua categoria, mas muitos dos nossos ficaram abatidos recebendo a
mesma medalha: talvez a gente só os incentive a valorizar o máximo. Como o pai
que não admite que seus filhos não sejam em tudo os primeiros.
O que o Brasil tem conseguido nesta
Olimpíada é muito se comparado ao pouco que oferecemos. Nossos adversários vêm
de países que, mesmo pobres alguns, os tratam como príncipes. Não vemos atletas
estrangeiros procurando oportunidades no Brasil, mas os nossos muitas vezes
precisam sair daqui para buscar condições de trabalho, reconhecimento,
crescimento e sucesso. Assim, muitos jovens intelectuais, cientistas,
universitários, acabam indo embora, pois aqui não encontram estímulo nem
trabalho à sua altura. Ou são aplaudidos no momento do sucesso, da descoberta,
da medalha, e depois esquecidos. A busca da excelência em todos os campos da
atividade humana, desde a dignidade básica até a educação, a saúde, a segurança,
oportunidades — hoje incluindo os esportes —, não tem sido prioridade nossa.
Voltando aos ministros do Supremo:
neles está nossa esperança de que esses que por anos a fio “macularam nossa
pátria” sejam punidos, se provada a sua culpa. Poderemos então respirar com
peito mais desafogado e receber, como povo e como indivíduos, uma verdadeira
medalha de ouro. O fardo que carregamos, nós que nos informamos, nos
preocupamos, e lutamos pelo bem do Brasil, tem sido pesado demais.
REVISTA VEJA ( 15 de
agosto de 2012 )
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